Rogério Ceni pode não dar certo no Flamengo. A ótima atuação na maior parte do jogo contra o frágil Coritiba tampouco é garantia suficiente de que o rubro-negro reencontrou o futebol que o levou à conquista de cinco títulos, entre eles o Brasileiro e a Libertadores.
Uma coisa, porém, se torna evidente. O erro colossal, piramidal mesmo, pode-se dizer, cometido pelo catalão Domènec Torrent, ao querer modificar imediata e radicalmente o modo de jogar de um time que encantara o país em 2019 e, por que não dizer, nos meses iniciais de 2020, pré-pandemia.
Com Ceni resgatando o esquema tático de Jorge Jesus (que ele faz questão de ressaltar, também já era o seu, no início do trabalho no Fortaleza), o Flamengo teve três tropeços iniciais sob o seu comando mas, notadamente nos primeiros tempos das partidas contra o São Paulo, já dava mostras de evolução, se comparado aos tempos do futebol de totó de Torrent.
Basicamente, o que fez Rogério? Recriou a dupla de atacantes (originalmente formada por Gabigol e Bruno Henrique) e deu aos meias, que teoricamente atuam pelos lados do campo, liberdade para se deslocar à vontade, chegando, em alguns momentos, a trocar de posição. Em suma: recuperou a alta rotatividade do time que desnorteava seus adversários, exatamente por essa intensa movimentação. Acabou aquela história de ficar guardando posição e esperar a bola chegar.
É claro que ter, novamente juntos, Arrascaeta e Éverton Ribeiro, como aconteceu contra o Coritiba, ajuda bastante. Mas Dome, é importante recordar, contou com eles em várias partidas (no início, nem sequer os escalava ao mesmo tempo porque não queria) e o futebol não encantava. Bom treinador, sempre faço questão de repetir, é aquele que adapta o seu modo de jogar às características do elenco do clube que dirige. O próprio Rogério Ceni, ao comentar as similaridades entre o seu esquema e o de Jorge Jesus, explicou:
— No Fortaleza, pelos jogadores que eu tinha, meus homens de lado de campo atuavam abertos. Aqui, meus meias vêm por dentro.
É isso. As ideias têm que se adaptar ao elenco. Não o contrário. E Domènec nunca concordou com isso, repetindo, como num mantra, que tinha um esquema há 13 anos e não via o porquê de fazer qualquer adaptação. Mais ortodoxo (e, convenhamos, pouco inteligente) impossível.
Nem a propalada (e real) falta de tempo para treinar o absolve. Ao contrário, aumenta sua culpa, uma vez que uma mudança radical na forma de jogar exigiria exatamente o que ele não tinha: tempo para treinar. Mais um motivo para preservar, ao menos nesta temporada, a fórmula vencedora que recebeu de mão beijada. Bastava fazer o que Ceni tem feito: conversar com os jogadores e entender a forma de atuar na qual se sentem mais à vontade e, consequentemente, o futebol da equipe produz mais.
Contra o Racing, na Argentina, o Flamengo deverá ter novamente em campo, após muito tempo, o seu quarteto ofensivo mais talentoso: Arrascaeta, Éverton Ribeiro, Gabigol e Bruno Henrique. A dupla de ataque ainda está longe da forma espetacular que a tornou tão decisiva nas principais conquistas, mas é capaz de fazer a diferença. O maior problema continua a ser a defesa, devastada por desfalques nos últimos jogos. Diante dos argentinos, entretanto, Isla e Filipe Luís, ao menos, estarão a postos nas laterais. Falta a volta de Rodrigo Caio.
No Brasileirão, a rodada do último final de semana foi extremamente favorável ao Mais Querido, que venceu e viu praticamente todos os seus adversários diretos na luta pelo título tropeçarem. A luta pelo topo da tabela está mais acirrada que nunca. Quem ainda pode desequilibrar a disputa pela ponta é o São Paulo, com seus três jogos adiados.
Mas, depois do medíocre empate com o Vasco, em pleno Morumbi, será capaz de somar, nestas três partidas, os pontos necessários para disparar? E o trabalho de Fernando Diniz, antes tão criticado, continuará a ser incensado, após os três triunfos contra o (esfacelado) rubro-negro carioca?
A conferir…
Créditos do texto: Renato Mauricio Prado/UOL