Um dos clubes mais ricos do país, que conquistou uma Libertadores, dois Brasileiros e se firmou como grande protagonista na América do Sul nos últimos anos, o Flamengo fez quase tudo certo na gestão que permitiu ao time se reconstruir e chegar ao topo. O que faltou a torcida fez questão de lembrar no último sábado (2) com a campanha #FlaAssumeAsMinas.
O Flamengo tem uma parceria com a Marinha para manter o time feminino desde 2015. Em 2016, a equipe rubro-negra chegou ao seu auge com o título do Campeonato Brasileiro da modalidade. Mas, desde então, com outros times de camisa investindo mais fortemente no futebol das mulheres, o clube perdeu protagonismo e teve uma queda considerável de desempenho.
Em 2017, o Rubro-Negro parou nas quartas de final do Brasileiro; em 2018 e 2019, foi eliminado pelo atual grande protagonista, o Corinthians, nas semis. Em 2020 e 2021, nem sequer passou da primeira fase e ficou com a nona colocação no geral.
É estranho ver um clube que não abre mão de ser protagonista em qualquer esporte que dispute ficar tão indiferente, só assistindo aos rivais paulistas tomando conta do cenário nacional e internacional no futebol feminino. Desde o título brasileiro do Flamengo (em 2016), o Corinthians já conquistou três vezes esse mesmo troféu, foi bicampeão da Libertadores e brigará pelo tricampeonato em novembro. E, nesta temporada, quem surgiu mais perto de quebrar a hegemonia corintiana foi o Palmeiras, vice-campeão nacional.
O Flamengo viu seu projeto sólido em parceria com a Marinha perder espaço e pouco fez para impedir isso. Antes, o clube levava certa vantagem de oferecer às jogadoras contratos longos e garantias de alguns direitos trabalhistas que as jogadoras não encontrariam em outros lugares —isso porque, para jogar no Flamengo/Marinha, a atleta precisaria passar num concurso do Exército.
Mas, de 2015 para cá, muita coisa mudou. Hoje, as melhores jogadoras conseguem salários mais altos, contratos mais longos e acabam escolhendo a melhor opção para a carreira —ficar numa equipe que não briga pelos principais títulos nacionais e internacionais não costuma ser uma boa escolha.
O Flamengo chegou a mesclar contratos para não depender apenas de jogadoras “concursadas” do Exército, mas ainda não assumiu por completo a gestão do futebol das mulheres. E mais: o clube em si parece não se importar com o time feminino, não se incomoda com os resultados ruins, vê outros times de camisa passando na sua frente e não faz nada para mudar isso.
Em 2022, de novo haverá um alto número de equipes de tradição do futebol masculino na primeira divisão do feminino: Corinthians, Palmeiras, São Paulo, Santos, Internacional, Grêmio, Cruzeiro, Atlético-MG, além do próprio Flamengo. E tem o Red Bull Bragantino, que tem construído um projeto interessante também para as mulheres. Sem falar das equipes tradicionais do feminino, como Ferroviária e Avaí Kindermann.
Sem investimento, o Flamengo tende a ficar cada vez mais para trás e vai perder a chance de mostrar sua força em uma modalidade que está em franco crescimento e tem alto potencial de retorno. Mais: vai ignorar uma parte considerável de sua torcida que pede ao clube mais respeito e atenção com o futebol das mulheres, como ficou evidente na campanha lançada nas redes sociais.
Um clube do tamanho do Flamengo, com a relevância que tem no cenário nacional, precisa fazer mais pelo futebol feminino. Dinheiro não falta —o que falta, infelizmente, ainda é vontade.
Retirado de: Folha de São Paulo