O torcedor rubro-negro já viu esse filme e se lembra de jogos negativamente marcantes sob o comando de Vítor Pereira, Paulo Sousa, Domènec Torrent. Agora foi a vez de Jorge Sampaoli. A eliminação na Libertadores traz à tona um roteiro repetido no Flamengo. Nos momentos de crise no futebol, a diretoria sai de cena e há o choque velado entre elenco e treinador. A roda gigante gira e é pilotada, mesmo que indiretamente, pelo vice de futebol Marcos Braz, dirigente amador, que embora responda ao presidente Rodolfo Landim é o “01” da principal e mais rica pasta do clube, recheada de profissionais com histórico ou competência questionáveis, mas que atendem a um modelo que se forjou na fritura de técnicos para se perpetuar e, no fim do dia, conquistar títulos.
A estrutura amadora em termos de gestão ignora a hierarquia. Os jogadores não veem como líderes ou chefes seus superiores, que não se comportam como tal no dia a dia. O diretor Bruno Spindel é um negociador sagaz e um torcedor efusivo durante os jogos. Os gerentes Fabinho e Juan dois ex-jogadores que são “camaradas” dos atletas que formam o plantel.
Na prática, a cobrança, o desgaste, o desconforto, é sempre papel do treinador, ou dos torcedores de organizadas que estrategicamente aparecem para hostilizar a todos como no desembarque de ontem no Rio após a queda no Paraguai. Sampaoli foi o menos atacado. Sobrou para alguns atletas e para a diretoria, incluindo Braz, Spindel e Landim – o presidente se escondeu e aguardou os protestos para ir para casa. Como ninguém se apresenta para mais esclarecimentos, o foco se volta para o técnico.
O Flamengo tem optado, desde Jorge Jesus, por um perfil de profissional para terceirizar sua gestão de pessoas e crises. Nesse cenário, Braz perdeu o comando há tempos e alterna momentos de desgaste com a torcida com outros em que se vangloria pelos títulos recentes conquistados no campo, a base de muito dinheiro, e oriundo de uma administração competente das finanças rubro-negras.
— Longe do resultado que a gente queria, Flamengo não jogou bem, as coisas não aconteceram do jeito que a gente pretendia, a gente queria muito continuar nessa competição, competição que nos últimos quatro anos chegamos em três. Temos o Brasileiro e a Copa do Brasil aí que são títulos importantes — afirmou o vice, ainda no Paraguai, sem comentar sobre o futuro de Sampaoli.
Para que esse ciclo vicioso persista é preciso encontrar outro culpado para justificar o fracasso de um elenco milionário. E o elo mais fraco é sempre o treinador. A multa para interromper trabalhos vira um efeito colateral. Caso queira tirar Sampaoli, serão R$ 15 milhões, nada perdo da receita na casa do bilhão. A ordem de Landim e por consequência de Braz é seguir em frente, no aguardo que os jogos da Copa do Brasil sejam um alento para a temporada que parece irrecuperável.
Ao fim dela, Sampaoli dificilmente permanecerá, e o ciclo se reinicia, com os mesmos personagens no comando, uma reestruturação de elenco vagarosa, usada para alimentar uma fantasia irreal de que é possível ganhar tudo sempre, mas com um culpado diferente para ser responsabilizado por todos os outros quando algo não ocorrer como esperado.
Retirado de: O Globo
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