O Flamengo vive uma temporada de muita pressão. Além dos insucessos esportivos, que causaram protestos da torcida, o clube agora sofre com problemas de agressão, como o último envolvendo Gerson e Varela, o segundo no ano. Essa crise seria fruto de um desequilíbrio emocional de um time que não conta com um psicólogo desde abril de 2019?
Diante de todo o cenário explosivo vivido pelo Flamengo, o ESPN.com.br foi atrás de um profissional da área. Psicólogo Analítico do Esporte, presidente da Associação Brasileira de Psicologia do Esporte (ABRAPESP) e membro fundador da Associação de Psicologia do Esporte do Rio de Janeiro (ASSOPERJ), Rodrigo Pieri detalhou qual é de fato o papel de um psicólogo no trabalho diário de um clube de futebol e como esse profissional ajudaria um elenco na busca pelos objetivos de uma temporada.
“(O papel de um psicólogo esportivo é) Fazer esse trabalho de mediação entre as diferentes pessoas (de um clube) que carregam as suas histórias e têm seus desejos, anseios e objetivos de vida. é claro que dentro disso, quando falamos de rendimento, passa sim pela busca do resultado para ajudar que aquele ambiente esteja mais propício para poder ter um resultado. Mas eu diria que essa mediação de conflitos, do desejo, das histórias, é a base, é a estrutura para tudo”, disse Pieri.
Na prática, o Flamengo viveu um turbilhão de emoções em 2023 sem contar com um profissional da psicologia acompanhando de perto as emoções do elenco. Em oito meses, foram cinco insucessos esportivos (Mundial de Clubes, Supercopa do Brasil, Campeonato Carioca, CONMEBOL Recopa e CONMEBOL Libertadores) que deixaram marcas. Além disso, ocorreram também crises comportamentais que vão de indisciplina a agressões.
Mas como um psicólogo poderia ajudar o time rubro-negro nesses momentos delicados? Na visão de Pieri, o trabalho preventivo diário é o que a psicologia mais busca para que casos extremos como os últimos envolvendo o clube não aconteçam.
“A psicologia do esporte trabalha principalmente na prevenção, sem perder de foco as demandas que podem estar surgindo. É comum acharem que o principal trabalho da Psicologia do Esporte é o motivacional, mas não é o principal. A psicologia do esporte vai muito além”.
“Eu trabalho muito com um constructo teórico que se chama coesão. Existem dois tipos de coesão: coesão de tarefas e coesão social. A boa coesão de tarefa se dá quando a equipe tem definido um objetivo em comum, plausível e de comum acordo por toda equipe. A coesão social e o prazer de estar e de vivenciar esse processo junto”.
“Eu quando trabalho com equipes, eu penso e observo muito. Não adianta os jogadores terem grande prazer de trabalhar com as pessoas ali do dia a dia, quando não há um objetivo coletivo claro. E também não adianta nada ter um objetivo em comum, mas não gostar das pessoas, não querer estar ali, não querer compartilhar daquela vivência ali”, disse o Pieri.
É importante lembrar que o Flamengo já foi questionado sobre a ausência de um psicólogo no time profissional. Em resposta, o vice-presidente de futebol, Marcos Braz, chegou a dizer que o time profissional não carece deste suporte. Além disso, afirmou que a equipe “foi campeã de tudo” desta maneira.
Por outro lado, o zagueiro Fabrício Bruno é um que já revelou publicamente que teve uma melhora em seu rendimento desde que buscou ajuda psicológica. Pieri analisou as duas falas públicas de personagens de dentro do Flamengo e admitiu que as declarações podem causar efeitos em outros profissionais do clube, seja para inibi-los na busca por ajuda psicológica ou motivá-los.
“Da mesma forma que uma fala positiva pode fazer muito bem. Além de estimular e fortalecer com que o outro atleta possa buscar o trabalho de um profissional. A fala de uma liderança, tem um peso muito grande. Quando negativa pode inibir essa busca pela psicologia do esporte”.
“Importante dizer que há dois tipos de trabalho da Psicologia do Esporte que são importantes. Tem o trabalho individual, que ocorre quando o jogador busca por conta própria, e tem o trabalho institucional, quando é contratado do clube e trabalha com a equipe. Por isso, essas falas, tanto positivas, quanto negativas podem influenciar. As positivas tendem a fortalecer a ideia de buscar esse profissional. E as negativas tendem a inibir essa busca por esse profissional”, finalizou.
Em campo, o Flamengo tenta juntar os cacos de um momento delicado dentro das quatro linhas e conturbado fora delas. Com a vitória por 2 a 0 na ida sobre o Grêmio, o time avança à final da Copa do Brasil até com uma derrota por um gol de diferença. Resta saber se o time vai conseguir em campo se reequilibrar para evitar mais um fracasso na temporada.
Retirado de: ESPN