
A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) vive um momento delicado após a revelação de um sistema de vigilância interna instalado na sede da entidade. Segundo informações reunidas em uma ação trabalhista e documentos obtidos ao longo de investigações internas, o presidente Ednaldo Rodrigues é acusado de monitorar funcionários por meio de câmeras e grampos de áudio escondidos.
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A denúncia partiu da arquiteta Luísa Xavier da Silveira Rosa, que assumiu a diretoria de patrimônio da CBF em 2020. Conforme consta nos autos do processo, Rosa encontrou, em uma vistoria no sistema de segurança da sede da confederação, uma câmera com captação de áudio camuflada sob um detector de fumaça, localizada no restaurante da CBF, local de uso comum dos funcionários.
Ela ainda apurou que os registros audiovisuais eram armazenados em uma sala contígua ao gabinete de Rodrigues, com acesso exclusivo ao presidente. Segundo Rosa, uma conversa entre Ricardo Lima — cunhado de Ednaldo e presidente da Federação Bahiana de Futebol — e um funcionário do setor de TI, reforça a suspeita. Em tom informal, Lima autorizava a instalação de “câmeras escondidas no restaurante”, afirmando que o pedido deveria ser enviado ao setor de compras.
Ambiente de medo e silêncio
As revelações tiveram impacto imediato entre os cerca de quatrocentos funcionários da CBF. “Cuidado com o que você fala, tem grampo por toda a parte aqui”, teria alertado um bilhete entregue a um novo contratado. A partir de então, segundo relatos, muitos evitaram o uso do restaurante da entidade. Um dos funcionários afirmou, sob anonimato, que “chamamos aquilo de Coreia do Norte”, uma alusão ao clima de vigilância extrema e restrição à liberdade de expressão dentro da instituição.
Além da vigilância, uma pesquisa interna realizada no fim de 2023 indicou que mais da metade dos colaboradores não considera o ambiente de trabalho seguro. Entre os motivos, destacam-se o medo de retaliação e a descrença nos canais oficiais de denúncia.
Acusações de assédio e retaliações
As tensões aumentaram com as denúncias de assédio moral e sexual. Rosa, que também supervisionava as obras de centros de treinamento financiadas com recursos da Fifa, revelou ter sofrido retaliações após questionar contratos ligados à Granja Comary. As decisões passaram a ser centralizadas por Rodrigues e aliados, como Nazareth Filho, e pagamentos às obras foram suspensos.
A arquiteta ainda relatou ter sido alvo de elogios impróprios e convites indesejados por parte de Rodrigo Paiva, então diretor de comunicação da CBF, e de Nazareth Filho. Ambos foram citados nominalmente na ação judicial movida por Rosa, que resultou em uma condenação da CBF ao pagamento de R$ 60 mil por danos morais, embora a entidade esteja recorrendo.
“Percebi que a diretoria que me foi dada era apenas uma grande jogada de marketing”, afirmou Rosa, por meio de sua advogada, Cyntia Sussekind Rocha. A demissão da arquiteta ocorreu em julho de 2023, semanas após ela ter denunciado os abusos à Comissão de Ética da própria CBF. A justificativa oficial foi o suposto vazamento das denúncias à imprensa — acusação que ela nega veementemente.
Reações e desdobramentos
A resposta institucional veio por meio de ações judiciais. Ednaldo Rodrigues e Gamil Föppel, diretor jurídico da CBF, moveram queixas-crime contra Rosa e sua advogada por difamação. Ambas foram absolvidas no primeiro caso, enquanto o segundo ainda tramita na Justiça.
Atualmente, as denúncias e os processos judiciais lançam luz sobre a crise de governança que a CBF enfrenta. Aliás, o caso também reacende o debate sobre a transparência, segurança institucional e respeito aos direitos dos trabalhadores dentro da principal entidade do futebol brasileiro.