Indiciado no caso Bruno Henrique cogitou pedir empréstimo

A comemoração de Bruno Henrique após marcar um gol no jogo entre Atlético-MG x Flamengo pelo Campeonato Brasileiro 2024

A investigação da Polícia Federal (PF) sobre o esquema de manipulação de resultado envolvendo o atacante Bruno Henrique, do Flamengo, revelou não apenas o possível envolvimento de familiares do jogador, mas também de um grupo secundário de apostadores que, conforme apurado, teria recebido informação privilegiada. Um dos principais personagens deste núcleo é Andryl Sales Nascimento dos Reis, que foi indiciado por estelionato.

Segundo a apuração, Andryl apostou em três oportunidades específicas: duas apostas no valor de R$ 380 e uma de R$ 500, todas relacionadas à expectativa de que Bruno Henrique recebesse um cartão amarelo na partida contra o Santos, válida pela 31ª rodada do Campeonato Brasileiro de 2023. O inquérito aponta que essas apostas ocorreram em meio a conversas com teor de confiança no sucesso da empreitada e, ao mesmo tempo, tensão pelo desfecho do lance em campo.

Aliás, conforme mensagens acessadas pela PF, Andryl chegou a planejar uma viagem com sua companheira, indicando que o retorno financeiro das apostas custearia os planos do casal. “Se der tudo certo, nossa viagem tá paga”, escreveu ele.

A parceira, embora não esteja entre os indiciados, foi envolvida nos diálogos ao ponto de ser solicitada para criar uma conta em casa de apostas, numa tentativa de contornar limitações técnicas enfrentadas por Andryl.

Em outros trechos das mensagens trocadas, ele demonstra aflição durante o jogo. “Se der ruim vou pular da ponte, já tô avisando antes”, chegou a escrever em tom alarmante. Posteriormente, revelou que cogitou pedir dinheiro ao pai para ampliar os valores das apostas: “Vou pedir meu pai kkkk”. Apesar disso, afirmou que não repetiria a experiência. “Tá louco, tensão demais, mano”, disse, ao relatar o nervosismo que sentiu durante o andamento da partida, após o cartão ser aplicado a Bruno Henrique.

Ainda que não tenha vínculo familiar com o atleta, Andryl integra o segundo núcleo de envolvidos, que não participaria diretamente da articulação central, mas teria se beneficiado da informação repassada antecipadamente. Eventualmente, isso levanta dúvidas sobre o grau de disseminação da estratégia e a fragilidade do sistema de apostas em eventos esportivos.

Estrutura organizada e sincronia

Em paralelo às movimentações de Andryl, o inquérito conduzido pela PF detalha uma série de ações coordenadas entre pessoas próximas a Bruno Henrique. Três delas têm relação direta com o jogador: o irmão Wander Nunes Pinto Júnior, a cunhada Ludymilla Araújo Lima e a prima Poliana Ester Nunes Cardoso. Os três realizaram apostas semelhantes em diferentes plataformas e em horários muito próximos, todos prevendo que o atleta receberia um cartão amarelo no duelo contra o Santos, ocorrido em 01 de novembro de 2023.

A documentação aponta que Ludymilla chegou a criar uma nova conta na Galera Bet para ampliar as possibilidades de lucro. A PF observa que o comportamento dos envolvidos denota uma operação intencional de maximização de ganhos com base em uma única previsão: o cartão ao camisa 27 do Flamengo. “O cadastramento de novas contas com propósito de se realizar apostas em um único quesito se torna intrinsecamente suspeito”, afirma o relatório.

De maneira semelhante, a sincronização das ações do trio foi registrada no dia anterior ao jogo, com apostas realizadas em sequência entre 15h37 e 19h57, todas na operadora Kaizen Gaming (Betano), além da tentativa de Ludymilla de diversificar a atuação em outras plataformas. A PF ressalta que a estatística de cartões de Bruno Henrique em 2024 não justificaria tamanho volume de apostas concentradas.

O caso começou a ser investigado em agosto de 2024, após três casas de apostas relatarem movimentações incomuns relacionadas à partida. As análises dos celulares de Bruno Henrique e de seu irmão confirmaram que o próprio jogador teria sinalizado, com antecedência, que receberia o cartão, dizendo: “Não vou reclamar”, e “só se eu entrar duro em alguém”.

Como resultado, a PF indiciou Bruno Henrique por estelionato e fraude em competição esportiva. Ainda que a investigação do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) tenha sido arquivada por falta de provas em 2024, a PF obteve indícios mais robustos com o apoio do Ministério Público, aprofundando a análise dos dispositivos eletrônicos.

O Flamengo, por sua vez, declarou não ter sido comunicado oficialmente até o momento. Em nota, o clube reforçou seu compromisso com as normas do fair play esportivo, mas ressaltou o direito de defesa e a presunção de inocência do atleta.