Futebol francês sofre ameaças; entenda

Ligue 1 logo (Foto: Reprodução)

A atual crise no futebol francês atinge níveis alarmantes e ameaça a estabilidade da Ligue 1 e da Ligue 2. Embora o Paris Saint-Germain mantenha sua dominância nacional, boa parte dos clubes enfrenta riscos severos de falência e rebaixamento, como apontam recentes reportagens da L’Express e da FranceFootball, além de análises do jornal O Globo.

A derrocada do sistema começou, primordialmente, em 2020, quando os direitos de transmissão da Liga 1 passaram das mãos da tradicional Canal+ para o grupo espanhol Mediapro. Em um contrato avaliado em 780 milhões de euros, parecia o prenúncio de um novo momento para o campeonato.

Contudo, a pandemia da Covid-19 alterou drasticamente os rumos, como destacou a revista L’Express: “A Covid e o fim repentino do campeonato mudaram tudo”.

Com produção de baixa qualidade, preços altos e adesão insuficiente, a Mediapro solicitou revisão do contrato, deixou de honrar os pagamentos e, enfim, declarou falência no final de 2020. O impacto, inevitavelmente, desestruturou financeiramente os clubes, que, segundo relatos, já gastavam antecipadamente a receita prometida, sem sequer tê-la recebido.

Endividamento crescente e risco de falências

Conforme análise da revista FranceFootball, a saúde financeira dos clubes franceses deteriorou-se de maneira preocupante. Jean-Marc Mickeler, presidente do órgão de fiscalização da administração dos clubes, alertou que os prejuízos somados da Ligue 1 e da Ligue 2 devem ultrapassar 1,2 bilhão de euros (cerca de R$ 7,7 bilhões) até o final da temporada.

A situação é tão grave que várias equipes buscam desesperadamente novos investidores para evitar o fechamento. Conforme relatado, clubes como Lyon, Angers e Montpellier encontram-se em posições frágeis. Lyon, por exemplo, precisa comprovar ganhos de 100 milhões de euros para evitar o rebaixamento pela Direção Nacional de Controle e Gestão (DNCG).

Em Angers, houve atraso no pagamento de 60% dos salários em janeiro. Já o Montpellier, de Laurent Nicollin, buscou apoio financeiro emergencial junto a bancos de investimento.

O efeito dominó nas transmissões e no mercado

Atualmente, a DAZN, detentora dos direitos de transmissão da maior parte dos jogos, também sinaliza problemas. Por não atingir a meta de um milhão de assinantes prevista em contrato, a empresa inglesa ameaça romper o acordo. Em fevereiro, a DAZN reteve metade de uma parcela de 70 milhões de euros alegando falha da Liga Francesa (LFP) no combate à pirataria. Em resposta, os clubes votaram pela rescisão contratual, porém, sem consenso.

Anteriormente, a Amazon havia ocupado espaço na transmissão de jogos, substituindo a Mediapro em caráter emergencial. No entanto, a gigante do streaming optou por não participar da nova licitação. O cenário revela a dificuldade de tornar a competição atrativa para o público, como bem resume a revista L’Express: “Cada vez menos torcedores estão pagando para acompanhar a liga”.

A disparidade do PSG e a debilidade dos rivais

Enquanto a maioria dos clubes enfrenta uma crise sem precedentes, o PSG, financiado pelo fundo soberano do Catar, mantém uma trajetória de sucesso. Mesmo após as saídas de Mbappé, Neymar e Messi, a equipe conquistou o título nacional de forma invicta e chegou às semifinais da Champions League. A distância entre o PSG e os demais clubes franceses se torna, assim, ainda mais evidente.

Entretanto, o sucesso isolado do PSG não é suficiente para garantir a saúde do futebol francês. O presidente da Federação Francesa de Futebol, Philippe Diallo, em fevereiro, alertou: “Corremos o risco de ver clubes pararem de operar até o final da temporada. Ou talvez antes”.

Tentativas de solução e perspectivas

Diante desse quadro crítico, surgem iniciativas para tentar reverter o cenário. A revista FranceFootball sugeriu que seria essencial “tornar o campeonato mais atraente” para atrair e fidelizar assinantes. Alternativas, como a criação de uma plataforma própria de transmissão, começam a ser consideradas.

Aliás, a L’Express destacou a movimentação da família Arnault, proprietária do grupo LVMH, que, em novembro de 2024, recomprou o Paris FC, atualmente na segunda divisão. “A família Arnault salvará o futebol francês?”, questiona a revista, sugerindo que poderia haver um esforço de “refranquear” o esporte no país, já que atualmente cerca de 60% dos clubes pertencem a investidores estrangeiros.

Finalmente, é preciso destacar que, segundo relatório da Uefa, os clubes da Ligue 1 gastaram em 2023 cerca de 1,841 bilhão de euros com salários, o que representa 78% das receitas totais. Apesar de ser o menor valor entre as cinco principais ligas europeias, o percentual de comprometimento é o mais alto, evidenciando outra faceta do descompasso financeiro.